O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), o ministro Luiz Fux alterou na manhã desta quinta-feira (25) a ordem das pautas de julgamento no plenário da Corte na sessão de hoje. Com isso a ADPF 635, também conhecida como ADPF das Favelas, passou de terceiro para o sétimo item de pauta – o que na prática deve adiar a apreciação da matéria.
A mudança ocorre após violenta operação policial ocorrida na segunda-feira (22) no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, que deixou ao menos oito mortos. Os corpos das vítimas foram encontrados em um manguezal e retirados pelos próprios familiares. A chacina teve repercussão internacional e foi duramente criticada pelo Alto Comissariado da ONU para Direitos Humanos, que cobrou uma investigação imparcial e eficaz do Ministério Público.
“As chacinas do Salgueiro e a do Jacarezinho demonstram como a política de segurança do Rio atua completamente à margem da Constituição e das normas internacionais quando se trata em promover violência contra o povo negro e favelado”, afirmou Djefferson Amadeus, coordenador do IDPN (Instituto de Defesa da População Negra) e advogado do MNU (Movimento Negro Unificado). “Um eventual atraso no julgamento pode significar mais vidas perdidas para uma polícia que não se constrange em desobedecer a determinação do próprio STF de suspender operações policiais”, complementa o advogado.
No julgamento previsto para hoje, os ministros do STF avaliam um recurso do PSB (Partido Socialista Brasileiro), ONGs e movimentos sociais participantes da ação referentes às decisões cautelares aprovadas pelo Supremo em agosto de 2020. Na ocasião, o pleno da Corte concedeu medidas importantes como o vetar o uso de helicópteros como plataforma de tiro, restringir operações policiais em perímetros escolares e hospitalares, preservar vestígios da cena do crime e evitar remoções de corpos para a realização de perícia.
O recurso pede que sejam esclarecidas contradições no acórdão do último julgamento relativo ao pedido do plano de redução da letalidade. Na ocasião, os ministros justificaram que não havia necessidade de uma providência urgente do STF para este pedido porque já existe uma determinação de 2017 da Corte Interamericana de Direitos Humanos obrigando o estado do Rio de Janeiro a elaborar o plano. No entanto, como o governo fluminense nunca apresentou o documento, as entidades argumentam que o STF deve agir para reforçar a necessidade de o estado cumprir a decisão.
Outro pedido das entidades se refere à utilização de câmeras em todas as viaturas e fardas, além da criação de um Observatório composto por membros do judiciário e sociedade civil para monitorar o cumprimento das medidas impostas pelo STF ao governo do Rio.
Mais de 90 organizações da sociedade civil e movimentos sociais encaminharam ontem (24) um apelo urgente à ONU (Organizações das Nações Unidas) e à CIDH (Comissão Interamericana de Direitos Humanos) denunciando a chacina promovida pela polícia do Rio no Complexo do Salgueiro.
No documento, as entidades pedem que o estado brasileiro seja questionado sobre o episódio de violência e que deixou ao menos oito mortos, que seja assegurada investigações independentes, rápidas e imparciais, além de reparação e acesso às investigações aos familiares das vítimas e a todas as pessoas que sofreram violações
Pela primeira vez ONGs, coletivos e movimentos sociais ligados às favelas e a mães de vítimas das ações policiais processam o Estado do Rio de Janeiro pela sua política de segurança.
A ADPF 635 (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental), apelidada como “ADPF das Favelas” é uma ação proposta pelo PSB (Partido Socialista Brasileiro) e construída coletivamente com a Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, Educafro, Justiça Global, Redes da Maré, Conectas Direitos Humanos, Movimento Negro Unificado, Iser, Iniciativa Direito à Memória e Justiça Racial, Coletivo Papo Reto, Coletivo Fala Akari, Rede de Comunidades e Movimento contra a Violência, Mães de Manguinhos, todas entidades reconhecidas como amici curiae no processo.
A ação pede que sejam reconhecidas e sanadas as graves violações ocasionadas pela política de segurança pública do Estado do Rio de Janeiro à população negra e pobre das periferias e favelas.
O julgamento teve início em abril de 2020, quando o relator, o ministro Edson Fachin proferiu voto sobre algumas das medidas cautelares solicitadas. No fim de maio, após pedido cautelar das entidades, o ministro Fachin determinou a suspensão das operações policiais nas favelas durante a epidemia de Covid-19, salvo hipóteses absolutamente excepcionais, devidamente justificadas por escrito pela autoridade competente e com a comunicação imediata ao Ministério Público.