Tratar as relações exteriores como política pública é um dos maiores desafios do novo chanceler, Mauro Vieira, que assumiu o cargo nesta quinta-feira (1/1/15). Ele, no entanto, deu grande ênfase à economia em seu discurso de posse e não mencionou como tornar o Ministério mais transparente e próximo da sociedade. Veja abaixo alguns dos temas que ainda precisam sair do discurso do Itamaraty e virar realidade.
O Livro Branco, ou documento público com princípios, prioridades e linhas de ação externa do Brasil, seria publicado ainda em 2014, segundo declarou em novembro o ex-chanceler Luiz Alberto Figueiredo. Não foi. O documento segue sendo uma reivindicação importante da sociedade e foi o assunto mais mencionado na consulta popular online feita pela Câmara nas semanas anteriores à sabatina de Figueiredo pelos deputados federais.
Prometido desde 2013, pelo então chanceler Antonio Patriota, ainda se espera o aumento dos “canais de participação cidadã no Itamaraty”. A criação do Conselho Nacional de Política Externa responderia a essa necessidade. “Hoje, o debate sobre a atuação internacional do Brasil está limitado a um seleto grupo de ‘iniciados’ que conhecem e se movem através dos canais informais. Um conselho poderia democratizar essas relações”, afirma Camila Asano, coordenadora de Política Externa da Conectas.
Outra promessa reiterada em 2014 e não concretizada até hoje é a implementação de um site sobre cooperação humanitária, com informações sobre os recursos destinados pelo governo brasileiro ao tema. O portal Sigma (Sistema de Gestão, Monitoramento e Avaliação das Ações Humanitárias Brasileiras) deve dar mais transparência aos recursos destinados à ajuda internacional.
Um exemplo ainda de como o Brasil pode ocupar o protagonismo internacional que deseja é colaborar mais ativamente para a solução de crises globais. Em janeiro de 2014, o País anunciou ajuda de US$ 300 mil para as vítimas do conflito na Síria. A quantia divulgada pelo México – para usar um país latino-americano como comparação – foi 10 vezes maior. Ainda no começo de 2015 uma nova conferência internacional de doadores para crise síria deve ocorrer e espera-se que, no mínimo, o Brasil anuncie um montante condizente com um país que possui a sétima maior economia do mundo.
O fortalecimento do multilateralismo deve ser posto em prática com o apoio aos órgãos internacionais. O último aporte financeiro para a Comissão de Direitos Humanos da OEA (Organização dos Estados Americanos) foi de US$ 10 mil em 2009. O país também deve, segundo matéria de O Estado de S. Paulo publicada em dezembro, US$ 184 milhões para a ONU, com aportes atrasados para a as operações de paz, os tribunais internacionais, a Unesco e o orçamento regular da entidade.
Pautar decisões da chancelaria não apenas na economia, mas levando em consideração os direitos humanos é outra obrigação – constitucional – que precisa ser posta em prática, inclusive nas relações bilaterais do Brasil. “Uma forma de avançar nesse setor seria receber pessoas detidas ilegalmente em Guantánamo e que foram liberadas pelos EUA mas precisa da oferta humanitária de um país para acolhê-los”, disse Camila. “A visita oficial da presidente aos EUA, ainda este ano, pode ser uma boa oportunidade para isto.”
Um outro marco previsto para 2015 é a inauguração do Novo Banco de Desenvolvimento, também conhecido como Banco dos BRICS. O Brasil deve, para respeitar a obrigação constitucional de prevalência dos direitos humanos na política externa, impulsionar a criação de políticas socioambientais e de transparência aos financiamentos que o novo banco fará.