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18/04/2012

Ano carregado de pautas de direitos humanos marca chegada de Britto ao STF

Na presidência, ministro pode decidir sobre ações afirmativas e federalização de crimes contra direitos humanos

Na presidência, ministro pode decidir sobre ações afirmativas e federalização de crimes contra direitos humanos Na presidência, ministro pode decidir sobre ações afirmativas e federalização de crimes contra direitos humanos

A chegada do ministro Carlos Ayres Britto à presidência do Supremo Tribunal Federal (19/04) é marcada por um ano de agenda carregada de pautas importantes para a garantia dos direitos humanos no Brasil.
Responsável por guardar a Constituição do país, o Supremo poderá julgar, entre outros casos, a manutenção da medida provisória que criou o Programa Universidade para todos (ProUni) e a constitucionalidade do artigo de Estatuto da Criança e do Adolescente que regulamenta a política de classificação indicativa para programas de televisão.
Conectas participa de todos os casos listados abaixo. “A sociedade espera que durante 2012 o STF adote decisões positivas sobre casos fundamentais para a agenda de direitos humanos do Brasil”, diz Juana Kweitel, diretora de Programas da organização.
Casos liberados para a pauta do Supremo que poderão ser decididos em 2012:
1. Ações Afirmativas (Cotas)
i) ADPF 186: O Partido Democratas (DEM) propôs a Arguição de Descumprimento de Preceito fundamental (ADPF) requerendo que o STF declare inconstitucionais as normas da Universidade de Brasília (UNB) que criaram a reserva de vagas para negros. A ADPF foi ajuizada em 20/07/2009 e defende que a política cria um “Tribunal Racial” contribuindo para o racismo institucional. O relator do caso é o Min. Ricardo Lewandowski. Houve audiência pública com o objetivo de pluralizar o debate na sociedade civil.
Posição da Conectas: Conectas ingressou no caso como amicus curiae (juntamente com o Centro de Estudos das Relações do Trabalho e da Desigualdade – CEERT) contextualizando o histórico das políticas afirmativas no Brasil e como elas colaboram para o estabelecimento da igualdade racial no país e, consequentemente, uma sociedade mais justa e igualitária. Desse modo, mostrou-se favorável às ações afirmativas implementadas pela UNB. O principal argumento é que a ação afirmativa combaterá as barreiras que têm impedido os negros de acessarem direitos garantidos constitucionalmente a todos os cidadãos, principalmente educação e trabalho, de forma a superar o passado escravagista brasileiro.
ii) ADI 3330: A Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino (CONFENEN) propôs Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) contra a Medida Provisória (MP) que criou o PROUNI (Programa Universidade Para Todos), medida que estimula a adoção de políticas afirmativas pelas universidades particulares, por meio de incentivo fiscal, de modo a possibilitar o ingresso nestas universidades de pessoas formadas em escolas públicas (ou em escolas particulares com bolsa integral) e que não possuem condições econômicas suficientes para suprir os custos de um ensino superior. A ADI foi proposta em 21/10/2004 com o principal argumento de que a MP violaria os princípios da legalidade, autonomia universitária e isonomia ao criar a possibilidade de reservas de bolsas do sistema PROUNI aos alunos que se autodeclarem negros ou pardos, além de outros argumentos relativos ao processo legislativo. O relator do caso é o Ministro Ayres Britto, que já votou pela improcedência da ação e constitucionalidade dessa ação afirmativa. O julgamento foi interrompido pelo pedido de vista do Ministro Joaquim Barbosa.
Posição da Conectas: Conectas ingressou no caso como amicus curiae (juntamente com o Centro de Direitos Humanos – CDH) questionando a constitucionalidade do atual sistema de vestibular e apresentando dados referentes ao déficit educacional que possui um aluno formado em escolas públicas em relação a um aluno formado em escolas particulares, bem como sobre a desigualdade escolar entre brancos e negros. Entende serem as ações afirmativas um dos instrumentos eficientes para concretização da igualdade social.
2. Federalização de Graves Violações aos Direitos Humanos
ADIn 3486: A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), proposta pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), requer que o STF declare inconstitucional dispositivo da emenda constitucional nº 45/2004 que determinou que, em hipóteses de graves violações de direitos humanos, o Procurador-Geral da República pode solicitar perante o Superior Tribunal de Justiça o incidente de deslocamento de competência para a Justiça Federal no intuito de fazer cumprir obrigações internacionais decorrentes de tratados de direitos humanos. A ADIn foi ajuizada em 05/05/2005 e as requerentes argumentam que os critérios estabelecidos pela lei são vagos e que o deslocamento de competência violaria o princípio do juiz natural. O relator do caso é o Min. Dias Toffoli.
Posição da Conectas: Conectas ingressou no caso como amicus curiae (juntamente com o Centro de Direitos Humanos – CDH) oferecendo dados estatísticos e estudos referentes à impunidade em casos de violações de Direitos Humanos praticadas no Brasil, principalmente sobre casos relacionados à tortura. Apresentando pesquisas, tanto no âmbito nacional como internacional, dos atos que se enquadram em “grandes violações de direitos humanos”, como tortura e genocídio, posiciona-se favorável à necessidade de que nestes casos de graves violações aos direitos humanos haja intervenção da Justiça Federal como forma de assegurar o cumprimento das obrigações provenientes de tratados internacionais.
3. Ensino religioso em escolas públicas
ADI 4439: A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), proposta pela Procuradoria Geral da República (PGR) em agosto de 2010, vai contra o trecho do acordo entre o Estado brasileiro e a Santa Sé que prevê “ensino católico e de outras confissões” na rede pública de ensino do país (artigo 11, §1º, do Decreto n. 7.107/2010). A PGR pede ainda que o Supremo interprete o artigo 33 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), que determinada que o ensino religioso “é parte integrante da formação básica do cidadão”, no sentido de proibir o ensino confessional, interconfessional ou ecumênico.
Posição da Conectas: Conectas foi admitida como amicus curiae (juntamente com Ação Educativa, ECOS – Comunicação Em Sexualidade, CLADEM – Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher e Relatoria Nacional para o Direito Humano à Educação da Plataforma Brasileira de Direitos Humanos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais – Plataforma DHESCA Brasil). As organizações entendem que a educação pública deve respeitar o princípio da laicidade do Estado e mostram que, na prática das instituições de ensino, a liberdade religiosa é frequentemente violada. Por exemplo, em muitos sistemas de ensino, prevalece, nas séries iniciais do ensino fundamental, a oferta “transversal” do ensino religioso. Neste caso, o caráter facultativo das aulas fica ameaçado. As organizações sustentam também que o ensino religioso não pode compor o conteúdo obrigatório do ensino fundamental público e questionam o financiamento público direto desse ensino por parte do Estado.
4. Titulação das Terras Quilombolas
ADIn 3239: A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn) proposta pelo Partido da Frente Liberal (PFL), atual Democratas (DEM), requer que o STF declare inconstitucional o decreto nº 4.887/2003 que regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescente das comunidades dos quilombos. A ADIn foi ajuizada em 25/06/2004 e o requerente apresenta argumentos formais como, por exemplo, o fato de que o decreto questionado teria regulamentado diretamente o artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias quando, no ordenamento jurídico brasileiro, os decretos só poderiam regulamentar lei em sentido estrito. O requerente também argumenta que a possibilidade de desapropriação prevista no referido decreto seria inconstitucional, entre outros. O relator do caso é o Min. Cezar Peluso.
Posição da Conectas: Conectas ingressou no caso como amicus curiae (juntamente com o Instituo Pro Bono e a Sociedade Brasileira de Direito Público) propiciando um estudo científico sobre o histórico das comunidades quilombolas no Brasil e sobre o reconhecimento do direito dessas comunidades tratado na Constituição Federal de 1988. O principal argumento favorável à improcedência da ADIn se dá em razão do interesse social. Para garantia do direito conferido aos quilombolas, faz-se necessária a existência de um instrumento de desapropriação de terras particulares, com fins de se atribuir a respectiva titularidade a associações representativas de comunidades quilombolas. O julgamento teve início hoje, dia 18 de abril, mas foi interrompido pelo pedido de vistas da Ministra Rosa Weber. Apenas o relator do caso apresentou seu voto, que foi pela procedência da ação.
5. Proteção da Criança – Política de Classificação indicativa para programas de TV
ADIn 2404: O Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) propôs a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn) para requerer que o STF declare inconstitucional o artigo do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) que determina que não pode ser transmitido pelo rádio ou pela televisão programa “em horário diverso do autorizado”. A ADIn foi ajuizada em 06/02/2001 e argumenta que esse dispositivo do ECA violaria a liberdade de expressão e de manifestação do pensamento. O relator do caso é o Min. Dias Toffoli. O caso começou a ser julgado em 30/11/2011, quando o relator votou pela procedência da ADIn e inconstitucionalidade do artigo do ECA. Acompanharam o voto do relator os ministros Luiz Fux, Cármen Lúcia e Carlos Ayres Britto; o ministro Joaquim Barbosa fez pedido de vista, o que interrompeu o julgamento.
Posição da Conectas: Conectas entrou no caso como amicus curiae (juntamente com a Agência de Notícias dos Direitos da Infância – ANDI, Instituto de Estudos Socioeconômicos e Instituto Alana) apresentando dados que mostram a importância da classificação indicativa para a realização dos princípios constitucionais da comunicação social, bem como estatísticas de pesquisas sobre a preocupação da sociedade civil com o conteúdo que é apresentado na mídia e que pode afetar a formação de crianças e adolescentes. As entidades entendem ser a classificação indicativa constitucional, pois realiza o devido equilíbrio entre a liberdade de expressão e o dever de proteção absoluta da criança e do adolescente.
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Sobre o Supremo Tribunal Federal:
O Supremo Tribunal Federal (STF) é formado por onze ministros indicados pelo Presidente da República e aprovados por maioria no Senado Federal. O atual processo de nomeação de ministros não estabelece canais para a participação da sociedade civil, o que levou a Conectas e outras organizações a questionarem os critérios considerados para a indicação, bem como a inexistência de ferramentas disponíveis para que a sociedade contribua com tal processo.
O presidente do STF é eleito pelos próprios membros do tribunal e cumpre mandato de dois anos. O Presidente do Supremo Tribunal Federal é também o Presidente do Conselho Nacional de Justiça. Atualmente, o presidente é o Ministro Cezar Peluso, porém o Ministro Ayres Britto já foi escolhido para substituí-lo na Presidência a partir de abril. Ambos se aposentam neste ano e, por isso, deixarão o tribunal.
O STF exerce o controle de constitucionalidade em sede de Ações Direitas de Inconstitucionalidade (ADIn), por ação ou omissão, Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADC,) e Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF). Tal controle também pode ocorrer por meio do julgamento de Recursos Extraordinários e de remédios constitucionais, quais sejam, Mandados de Segurança, Mandados de Injunção, Habeas Corpus e Habeas Data. Ainda, cabe ao STF julgar casos que envolvam autoridades públicas federais, como o Presidente da República, Senadores, Deputados Federais, entre outros.
Os casos que chegam ao Supremo Federal são julgados por uma das duas Turmas, cada uma formada por cinco ministros (o presidente, neste caso, não participa), ou pelo Plenário, com a participação de todos os ministros. O Plenário julga as ações de temas relevantes e que tratam de violações à Constituição, e apenas ele pode declarar a inconstitucionalidade de uma norma.
Cada caso que chega ao STF é distribuído a um Ministro, que se torna o relator da causa. Como relator, recebe todos os pedidos e manifestações das partes, bem como profere o primeiro voto. Quando o relator está com seu voto pronto, o processo é liberado por ele para a pauta de julgamento, ficando a critério do presidente do tribunal definir quando ele entrará de fato na pauta de uma sessão de julgamento.
A Conectas vem atuando no STF na qualidade de amicus curiae, expressão que vem do latim e significa “amigo da corte”. Nessa condição, a organização apresenta um documento no processo que será julgado e realiza sustentação oral quando do julgamento da causa. Dessa maneira, busca oferecer subsídios aos votos dos ministros e pluralizar o debate constitucional, com o intuito de contribuir de forma ativa para decisões favoráveis aos direitos humanos.

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