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16/10/2013

A complexa relação entre empresas e direitos humanos

Colóquio discute os novos polos econômicos sob a perspectiva da proteção dos direitos humanos



O conflito de interesse muitas vezes existente entre o capital privado e o respeito ao meio ambiente e direitos humanos não é uma questão nova. Ações de responsabilidade social e até linhas de financiamento em bancos mundiais têm sido acionadas para mitigar esse processo. Mas não basta. Não é tudo.

A segunda sessão do XIII Colóquio Internacional de Direitos Humanos da Conectas trouxe o tema do desenvolvimento econômico, das grandes empresas e dos direitos humanos. Na mesa, Andressa Caldas (Justiça Global),  Bongumusa Sibiya (Legal Resources Center),  David Kinley (University of Sidney) e Kristen Genovese (The Center for International Environmental Law (CIEL) – veja a apresentação de Kristen aqui –  destrincharam, em cada setor, esse conflito e relataram suas experiências com o intuito de apontar caminhos para diminuir o fosso entre esses interesses. Juana Kweitel (Conectas) foi a moderadora. Confira:

Meio ambiente
Embora outros setores da economia, como o de desenvolvimento tecnológico, por exemplo, tenham também violado constantemente conquistas e direitos inalienáveis do trabalhador e do meio ambiente,  o setor da extração (mineração, petróleo e gás)  é, na sua natureza, altamente impactante. “É possível fazer uma mineração sustentável?”, questiona Andressa Caldas, da Justiça Global. “É um debate que precisa ser enfrentado”, completa. “Não é a toa que essas grandes empresas financiam grandes iniciativas de responsabilidade social.”


Nessa questão, o Estado também foi apontado como tendo um papel crucial, polêmico e não raro controverso. Assim, ao mesmo tempo em que depende desses setores para mover sua economia, ele tem o compromisso de vigilância e garantia do cumprimento da garantia de direitos. “Na prática, entretanto, o que ocorre é o licenciamento de projetos questionáveis e vista grossa para agressões claras para o meio ambiente”, denuncia Andressa.

Copa e empresas
A atuação de empresas e da economia privada também foi citada como capazes de interferir de maneira decisiva em manifestações populares. “A presidente Dilma Rousseff após uma reunião com a Ambev e o Itaú, grande patrocinadores da Copa, disse que não haveria protestos durante as competições”, disse  Andressa Caldas, da Justiça Global.

Bongumusa Sibiya, do Legal Resources Center, relatou que na África do Sul, o capital privado falou diretamente para membros do parlamento para aumentar a opressão policial em relação a revoltas populares. “São pessoas sem preparo para lidar com manifestações” disse.  “O que resultou em uso de armas de fogo e mortes”.

A experiência do litígio

Uma das questões levantadas durante o Colóquio foi a importância de litígios, ações judiciais, no sentido de assegurar direitos e abrir precedentes para outros casos. “Tivemos casos importantes de interferência na pena de morte na Africa do Sul, vigente até 1994”, disse disse Bongumusa Sibiya, do Legal Resources Center. “Outros casos envolvendo direito de prisioneiros e direitos de seguridade social para estrangeiros foram conquistados”,

Sibiya conta o caso de sucesso de compensações financeiras para trabalhadores que desenvolveram silicose, doença respiratória grave que afeta mineiros pela inalação de sílica. “Antes disso, muitas pessoas morreram”, conta. “Essas empresas pensaram que não seriam responsabilizadas, mas foram e em milhões”, comemora.

“A litigação foi importante na África do Sul, cria leis adjacentes à constituição que provê embasamento para outras questões”, explica.

David Kinley (University of Sidney) lembrou o caso da Shell que depois de 30 anos, fez um acordo de 53 milhões como compensação para casos de câncer e da Nike, que também dispendeu de milhões para indenizar vítimas em massa de racismo.

Como escolher casos para litígio
David Kinley também fez menção aos cuidados que devem ser tomados com o litígio. Assim, os casos escolhidos precisam ter:

    • Evidências significativas para serem levadas à Justiça
    • Financiamento
    • Abertura para aceitar a possibilidade de um acordo
    • Alianças globais para investigação do caso em outras nações
    • A obrigação dos Estados

Apesar de muitas políticas públicas e resoluções, foi apontada uma questão ortodoxa em direitos humanos muitas vezes esquecida: legalmente, o Estado é o único diretamente responsável pela proteção dos direitos humanos. “É a ele que devemos recorrer quando esses direitos são violados”, argumenta Kinley. O entendimento desse pressuposto dá mais complexidade a circunstâncias específicas de violação: como o caso de empresas transnacionais e violação de direitos humanos de estados fora do seu território.

“Não há nenhuma obrigação legal para que corporações respeitem direitos humanos e isso é uma questão importante”, diz Kinley. “Também nenhum documento internacional ou organização é capaz de obrigar essas empresas a respeitar direitos humanos”, continua.

“Queríamos que fosse diferente, mas não é. Por enquanto, só o estado é responsável”, reforça.

No entanto, uma série de litígios e jurisprudências tem sido estabelecida por organizações de direitos humanos no mundo inteiro que ajudam a contemporizar conflitos.  Há o entendimento de que o Reino Unido e os Estados Unidos são responsáveis por violações de direitos humanos no Iraque, por exemplo – como Israel também o é em ações feitas fora do seu território. Muitos desses entendimentos, entretanto, vieram de resoluções da ONU, não inteiramente aplicada em muitos casos.

Veja mais fotos do XIII Colóquio Internacional de Direitos Humanos aqui.

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