A disseminação do novo coronavírus no Brasil afetou as comunidades quilombolas de maneira especialmente dramática. Em todo o país, foram registrados mais de cinco mil casos e 250 mortes nestes grupos até abril de 2021, de acordo com dados da Iniciativa Quilombo sem Covid-19.
Diante das falhas e omissões do governo federal na proteção das comunidades quilombolas, a Conaq (Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas) e cinco partidos de oposição apresentaram uma ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) ao STF (Supremo Tribunal Federal) demandando medidas emergenciais para garantir a dignidade e os direitos dessas populações, além da preservação de seu modo de vida, que faz parte da identidade e do patrimônio cultural brasileiro.
A ação pede a elaboração de um Plano Nacional de Combate aos Efeitos da Pandemia de Covid-19 nas comunidades quilombolas, além da distribuição de produtos de proteção individual e higiene, água e alimentos, e medidas de acesso à saúde e combate ao racismo. Também solicita a suspensão de todas as operações de reintegração de posse no país.
A Conectas e o ISA (Instituto Socioambiental) foram admitidos no caso como amicus curiae e, em memoriais assinados em conjunto com a Associação Quilombola e Afrodescendentes da Restinga, a Coordenação das Associações Remanescentes de Quilombos do Pará (Malungu/Pará), a Federação das Comunidades Quilombolas do Estado de Minas Gerais (N’Golo) e a Terra de Direitos, afirmam que o Estado brasileiro violou a Constituição e normas internacionais de direitos humanos ao não proteger a população quilombola de maneira específica durante a pandemia.
Para as entidades, a elaboração e a aplicação do plano emergencial proposto pelos peticionários seria o “único remédio capaz de debelar a grave omissão do Poder Público e mitigar os efeitos da pandemia nos territórios quilombolas”. Elas também enfatizam a importância de proibir as reintegrações de posse, já que a permanência dessas populações em seus territórios permitiria um maior controle do espaço comunitário, a formação de barreiras sanitárias e a redução dos contágios.
O ministro relator Marco Aurélio Mello acatou o pedido dos peticionários, mas deixou de fora do voto a suspensão das operações de reintegração de posse. Essa exclusão foi revista pelo ministro Edson Fachin, que não só determinou o fim das operações, como também ampliou e detalhou as medidas emergenciais a serem tomadas pela União.
Essa interpretação foi endossada por outros oito ministros e, ao final do julgamento, o plenário do STF determinou que o governo federal apresentasse um plano de enfrentamento à Covid-19 nas comunidades quilombolas em um prazo de 30 dias. Outras medidas contempladas pela Corte foram a instituição de um grupo de trabalho interdisciplinar e paritário para debater, aprovar e monitorar o plano, a notificação compulsória de casos de Covid-19 entre quilombolas e a inclusão imediata do quesito raça/cor/etnia nos registros sanitários.
Ficha técnica
- Ação: ADPF-742
- Instância: Supremo Tribunal Federal
- Status: Julgamento concluído
- Tramitação:
- Protocolo da ação: 9/9/20
- Pedido de ingresso como amicus curiae: 28/9/20
- Conectas e ISA são admitidos como amicus curiae: 13/10/20
- Início do julgamento: 12/2/21
- Conclusão do julgamento: 24/2/21