O Comitê contra Tortura das Nações Unidas realiza durante esta semana uma revisão do Brasil em relação às medidas adotadas para combater a prática da tortura no país. O processo de revisão é realizado periodicamente a todos os países signatários da Convenção das Nações Unidas contra a Tortura.
Composto por 10 peritos independentes, o comitê, sediado em Genebra, Suíça, é responsável por monitorar a implementação da Convenção e analisar relatórios dos Estados-partes, bem como conduzir diálogos construtivos com os governos sobre questões relacionadas à prevenção da tortura e tratamento de vítimas.
Durante a revisão, o órgão analisa o relatório apresentado pelo governo brasileiro, bem como relatórios de organizações da sociedade civil e outras fontes independentes. O objetivo da revisão é identificar áreas onde o Brasil pode melhorar na prevenção e combate à tortura, bem como fornecer recomendações para ajudar o país a cumprir plenamente suas obrigações internacionais.
A revisão brasileira ocorre nesta quarta-feira e quinta-feira e é possível acompanhar pelos canais da ONU.
Em relatório enviado ao processo de avaliação, cinco entidades da sociedade civil brasileira apontam que o Brasil implementou seu Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, liderado pelo Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, em 2014. Embora o Mecanismo tenha ganhado impulso desde sua criação, foi duramente atacado pelo governo Bolsonaro, exigindo, inclusive uma estratégia jurídica no STF para manter seu funcionamento. Outro problema é o grande acúmulo de trabalho deste órgão, responsável em fiscalizar prisões, hospitais, comunidades terapêuticas e outros espaços.
O texto aborda também a implementação de audiências de custódia no sistema judiciário brasileiro, que surgiu em 2015 como uma medida para diminuir o tempo que as pessoas passam presas antes de comparecer perante um juiz, possibilitando, portanto, a identificação de maus tratos contra as pessoas custodiadas, por exemplo. Além de demonstrar que pouco é feito em caso de tortura cometidas por agentes públicos contra pessoas presas, as entidades apontam no relatório que a pandemia da COVID-19 trouxe desafios para a realização dessas audiências. A possibilidade de realização de audiências virtuais foi aprovada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), apesar da legislação que as proibia. O documento apresenta os impactos negativos da virtualização das audiências, como a falta de detecção de tortura durante as audiências virtuais. Além disso, destaca que a maioria dos estados do Brasil ainda não retomou as audiências de custódia presenciais, o que pode levar a violações de direitos dos detidos.
O Brasil é signatário da Convenção das Nações Unidas contra a Tortura desde 1989 e apresentou seu último relatório ao Comitê contra Tortura em 2017. Desde então, o país tem enfrentado críticas e desafios significativos em relação à violência policial, tortura em prisões e tratamento de migrantes e refugiados.
O Comitê contra Tortura é um importante mecanismo de monitoramento da Convenção das Nações Unidas contra a Tortura e um ator fundamental na luta global contra a tortura. A revisão do Brasil é um lembrete importante de que a tortura é uma violação dos direitos humanos e de que todos os países devem trabalhar juntos para preveni-la e combatê-la.
“A tortura é uma prática constante em diferentes locais no país e, em muitos casos, praticada pelo Estado contra cidadãos e cidadãs. É fundamental que a ONU deixe evidente para o Estado brasileiro que não existe democracia plena com violações de direitos”, afirma a advogada Carolina Diniz, coordenadora do Programa de Enfrentamento à Violência Institucional da Conectas, que acompanha a revisão.
O ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, chefe da delegação do Brasil no Comitê Contra Tortura da ONU em Genebra (Suíça), assumiu o compromisso do Estado brasileiro no combate a tortura e outras violações de direitos humanos e de respeito à memória de vítimas da ditadura militar. Durante um pronunciamento na quarta-feira (19), o ministro afirmou que o enfrentamento à tortura é central na construção da democracia no país.