Em 1990, após anos de construção conjunta, o Brasil sancionou uma nova lei que se tornaria referência na proteção da infância e juventude – o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente). A lei deu concretude às disposições da Constituição de 1988, que havia incorporado a Doutrina da Proteção Integral estabelecida em normas internacionais como a Convenção Internacional dos Direitos da Criança e as Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça da Infância e da Juventude (também conhecidas como Regras de Beijing).
Esse novo marco na legislação brasileira colocava fim ao Código de Menores de 1979, que responsabilizava as próprias crianças e adolescentes por sua vulnerabilidade e instituía, como regra de tratamento, a intervenção externa do Estado por meio do “juiz de menores”. Na Doutrina da Proteção Integral, ao contrário, crianças e adolescentes são reconhecidos como sujeitos de direito e cabe ao Estado, à família e à sociedade como um todo garantir os seus direitos e a sua proteção.
Em 2005, o PSL (Partido Social Liberal) ingressou com uma ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) no STF (Supremo Tribunal Federal) questionando a constitucionalidade de diversos artigos do ECA e pedindo a revogação completa da norma. Os peticionários sustentavam que a liberdade das crianças de ir e vir prevista na lei violava a Constituição e defendiam a imposição de medidas privativas de liberdade – como é o caso da internação – para crianças de até 12 anos.
A ADI-3446 também afirmava, de maneira equivocada, que as atribuições conferidas pelo Estatuto aos Conselhos Tutelares afastariam a participação do Judiciário na análise de infrações graves eventualmente cometidas por crianças e adolescentes.
Em amicus curiae elaborado em conjunto com AMAR (Associação de Mães e Amigos de Crianças e Adolescentes em Risco), Fundação ABRINQ pelos Direitos da Criança, CDH (Centro de Direitos Humanos), Fundação Projeto Travessia e Instituto Pro Bono, a Conectas argumentou que a vulnerabilidade das crianças e adolescentes no Brasil é provocada pela pobreza e ausência de condições materiais de existência que o Poder Público tem fracassado em suprir.
As entidades também sublinharam que a Constituição veda a privação de liberdade de qualquer pessoa, exceto nas hipóteses de flagrante ilícito e por ordem judicial (e sempre de acordo com o devido processo legal). Para as organizações, permitir a internação de crianças e adolescentes pelo simples fato de estarem em espaços públicos violaria essa garantia e representaria uma clara discriminação contra este grupo da população, com potencial de agravar as péssimas condições dos locais de privação de liberdade.
Ficha técnica:
Ação: ADI-3446
Instância: Supremo Tribunal Federal
Status: Classificada como prejudicada por conta da Lei 4.151/2003.
Tramitação: Ação é declarada improcedente.
- 13/7/1990 – Sanção do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) / Lei 8.069/1990
- 29/3/2005 – Petição inicial
- 27/4/2005 – Pedido de ingresso como amicus curiae
- 7/8/2019 – Início do julgamento e sustentações orais das entidades admitidas como amicus curiae – entre elas, a Conectas e as organizações parceiras
- 8/8/2019 – Ação é declarada improcedente nos termos do voto do relator, o ministro Gilmar Mendes